Poderiam ser cardiografias, naturografias, herbagrafias, cartografias da vibração da sensibilidade. É como um rumor de linhas que vão escrevendo um poema sem palavras, uma vereda sem caminhos, um desejo, pegadas de luz… como vestígios eróticos dum fio de seda, grafias que reduzem e abrem espaços, vias que desenham destinos impensados. Tudo o que é bonito, simples, parece fácil, mas estes desenhos de Teresa Gonçalves Lobo, são o signo da facilidade na dificuldade, porque não é comum dizer tanto com tão escassos e tão sóbrios meios plásticos.

Desenhos e gravuras para uma anunciação; oferta de vibrações, de murmúrios, de rumores de linhas, que soam como música, como uma estrutura montada em silêncio, canto da solidão, que é o que faz grande a Arte. Desenhos de linha que se amontoam até fazer um cacho de noite ou de neblima, filamentos de luz. Com o título de “Percursos”, que são caminhos percorridos, trajectórias, Teresa Gonçalves Lobo traz uma sucessão de signos que simbolizam e indentificam formas essenciais.

Raul Perez, o sucessor do surrealismo em Portugal, o grande criador, silencioso e luminoso, poeta e mago, escreveu acerca da pintora madeirense: “(…) a sua mão desenha ao sabor do coração, permitindo que tudo o que nele existe de mudo e ignorado se manifeste. Estas obras inquietam-nos pela força da sua verdade e simultaneamente enternecem-nos pela sua extrema simplicidade e pureza”.

Teresa Gonçalves Lobo, Madeira 1968, estudou desenho, pintura e gravura no Ar.Co – Centro de Arte e Comunicação de Lisboa e realizou cursos de técnicas fotográficas no Cenjor. Em 2004 tem a sua primeira individual no Centro de Congressos de Porto Santo e participa num mural alusivo ao 25 de Abril na Câmara Municipal de Lisboa. Em Montemor- o-Novo presta homenagem a Mário Cesariny, na exposição “Arte na planície”. Participa numa colectiva em Paris e leva a cabo “A pintada a duas mãos”, em coautoria com Raul Perez. Em 2007, no Clube de jornalistas, mostra “Escrita”, onde relaciona pintura e palavra. Em Madrid é finalista do XII Prémio de Grabado Comtenporaneo de la Direccion General de la Mujer.

Vermelho e preto sobre um mundo branco, para dar sentido ao que vive. Raios de luz, com fios de noite, que prendem correntes de linhas, como a água que corre ao mesmo tempo que se faz rio. Corpos, árvores, mapas, cortinas, redes, ninhos, vulcões, síntese do caos e da ordem, com uma economia de meios que surpreende, deixando o registo da vibração ascética de uma sensibilidade poética.

Uma estética na esteira de Wols, de Hartung de Ana Hatherly, como muito bem explica no catálogo, Maria João Fernandes, crítica e poeta, que se aprofunda de forma esplêndida, no mundo de seda finíssima de Teresa Gonçalves Lobo, analisando de onde vem e para onde vai, desde o seu território de assombro e de tremor das linhas que cantam um coral de fogo negro, branco e vermelho.

in El Punto de las Artes no 910, 4 a 10 de Abril de 2008