1
A linha não estremece
de tão firme a mão
ao desenhá-la sobre o papel
escorre a tinta-da-china
espalha o negro baço
como sulco ou veia
escondendo a raiz
da sombra a procurá-la

2
Alinham-se paralelas
como carris à espera
da viagem outras centrifugas
mais livres como pardais
no equilíbrio do seu ramo
pousam
interrogando o tempo que lhes sobra

3
Todas as linhas em silêncio
perfiladas as janelas
obscura voz
casa das artes o que ficou no limiar
sozinho
desejo impresso de o contornar

4
O poema em linha reta
de Álvaro de Campos na
persistente caligrafia como pedra fechada
no seu canto
em vão procura a mão que o liberte
manuscrito o livro de horas
a pobre arquitetura destas casas,
frágeis adobes, traves, argamassas
varanda a sul para um poeta que acaba de nascer

5
Também se afastam
as linhas da memória
outras rarefeitas
incisas permanecem ocultas
deixa que as navetas, o cais,
o ouro das talhas e
o açúcar da ilha
redimam a história e o lugar
da morte não caiba
na terra que a cobre

6
Abertas quase no silêncio que respiram
mapa dos sentidos
água forte gravada
sobre o cobre mais duro
arpão apontado ao
teu nome voo rasante
aumenta a distância a superfície
da sombra contra o sol

7
Inteira ou quebrada
comovente sussurro
de insatisfeita cobra adormecida